Contrários à verticalização vivida pela Lapa nos últimos anos, moradores do bairro da zona oeste de SP travam desde 2009 uma batalha pela preservação do patrimônio histórico local.
Àquela época, o Conpresp (conselho municipal do patrimônio histórico) excluiu 23 edificações de um processo de tombamento aberto em 2004 –muitas delas antigas fábricas e galpões industriais.
Capitaneado por entidades como o Mover (Movimento de Oposição à Verticalização da Lapa) e o Defenda São Paulo, o grupo temia que a decisão abrisse ainda mais espaço para o avanço de novos empreendimentos. Nesse pedaço da cidade fica a Vila Romana, um dos maiores alvos do mercado imobiliário paulistano.
Pouco mais de dois anos depois do “descongelamento” da área, o temor da população começa a se materializar. Na rua Faustolo, por exemplo, três torres serão erguidas.
A Gafisa e a Pluciennik & Partners, duas das construtoras que investiram no local, dizem que, quando compraram dois dos terrenos em questão, os imóveis não estavam mais em processo de tombamento. A AGL Realty não quis se manifestar, e a Atlântica não respondeu aos pedidos da reportagem.
PLANO DIRETOR
Os imóveis do bairro da Lapa entraram nesse processo de tombamento em uma revisão do Plano Diretor, em 2004. Na ocasião, a população indicou em audiências públicas nas subprefeituras os bens que gostaria que fossem preservados na cidade. Na Lapa, foram 51 edificações.
Em 2009, o conselho decidiu excluir 23 bens do tombamento. Entre eles, sobrados e galpões “sem valor arquitetônico ou histórico, além de casas em precário estado de conservação”, diz José de Assis Lefèvre, presidente do Conpresp.
“Essa ação de tombamento resultou de uma situação excepcional, em que o processo foi aberto com uma listagem de imóveis sem acompanhamento de pesquisas, estudos técnicos ou levantamentos fotográficos”, afirma Lefèvre.
Nas reuniões em que decidiu pelas exclusões, o conselho tombou outros 20 imóveis no bairro da Lapa –como o Sesc Pompeia, projetado por Lina Bo Bardi. Oito prédios da região seguem sob análise.
Foram pouco mais de quatro anos entre a abertura do processo de tombamento e a decisão do conselho. O prazo para avaliar o caso era 2006 –data prevista pela revisão do Plano Diretor. Há outras ações, porém, que se arrastam desde a década de 1990.
Uma das reivindicações dos moradores era o tombamento integral da Fábrica Companhia Melhoramentos. Porém, somente o prédio administrativo foi protegido –os galpões ficaram de fora. A Melhoramentos não quis se pronunciar.
“O Conpresp não nos recebeu até hoje. Queríamos mostrar exemplos da requalificação de edifícios industriais em outros lugares”, afirma Ros Mari Zenha, representante do Mover. “Por que não podemos aprender com experiências bem-sucedidas em vez de derrubar e dar lugar a novos espigões?”, questiona ela.
O Conpresp esclarece que é a Lei de Zoneamento, do Plano Diretor, que determina o que pode ou não ser construído na cidade. Segundo a procuradora de Justiça Luiza Eluf, que foi subprefeita da Lapa entre 2007 e 2008, o processo “foi justo”.
“Se alguns imóveis não foram tombados por não apresentarem valor histórico nem arquitetônico, muitos outros foram efetivamente protegidos”, afirma ela. “O tombamento não pode ser usado para evitar a especulação imobiliária.”
DIFERENTES USOS
Para Cristina Meneguello, professora da Unicamp e membro fundador do Comitê Brasileiro de Preservação do Patrimônio Industrial, falta inteligência arquitetônica no reaproveitamento dos antigos galpões industriais, que “podem ser incorporados aos novos projetos”.
De acordo com Manoela Rufinoni, especialista em patrimônio histórico industrial da Unifesp, não é possível proteger tantos bens na cidade. “Então, se faz uma seleção, que às vezes não agrada à comunidade.”
Fonte: Folha.com